Susan Alcorn (EUA, 1953) tem um trajecto raro para alguém que, como ela, tenta continuamente transcender as fronteiras da expressão sonora e do léxico musical. Começando por tocar guitarra slide, aquando de um encontro fortuito no início da sua carreira com Muddy Waters, que lhe indicou o instrumento como sendo o adequado para os seus intuitos da época, ia igualmente dividindo o seu tempo no dobro, influenciada por mestres como Josh Graves ou Tut Taylor.
Aos 21 anos toma a decisão de pegar na guitarra pedal steel, um instrumento principalmente conotado com a música country & western em que estava imersa. É nesse universo que se mantém concentrada durante largos anos, como uma cotadíssima música de acompanhamento, onde aprende milhares de temas do cancioneiro sulista norte-americano. Paralelamente, começa um estudo sério de formas extraordinariamente diferentes, dedicando-se a Roberta Flack, Mercedes Sosa, Penderecki, Messiaen, John Coltrane e Ornette Coleman, figuras que começaram a permear-se no seu vocabulário.
É em correspondência com o pianista Paul Bley no final dos anos 1980 que o seu trabalho solista começa a desenhar-se nas formas que conhecemos hoje, quando Bley sugere a Alcorn que esse seria o momento em que devia começar a processar e aglutinar toda essa informação estética, e a desenvolver um discurso próprio concordante com a aprendizagem que vinha fazendo. Estará precisamente aí uma das virtudes preciosas de Susan Alcorn, que a separam – com a excepção dos músicos provenientes do jazz – da vasta maioria dos criativos que habitam as regiões da improvisação, bem como da composição mais livre e longínqua de trâmites académicos. É a abrangência da cultura, técnica e abertura estrutural e lexical de Alcorn, que conhece como poucos a história cada vez mais insular da country, e que se estende até à música contínua de Pauline Oliveros, ao jazz existencialmente mais ambicioso, à música gamelã, à canção libertária sul e centro-americana, à composição contemporânea e inclusivamente à história da própria improvisação.
Em 2007 editou o seu mais recente trabalho a solo, And I Await... The Resurrection of the Pedal Steel Guitar (Olde English Spelling Bee). Um tratado essencial das possibilidades discursivas, tonais, texturais, espaciais e anímicas de um instrumento que, tocado por Alcorn, se revela ser.