O designado “teatro de repertório” assenta num princípio de repetição e diferença: a mesma peça é apropriada por sucessivas companhias, ou por sucessivos encenadores, uma vez após outra, durante décadas ou séculos1. Pratica-se o equilíbrio entre a reiteração ritualista da sua qualidade (a repetição em si) e a revelação mais pura da sua essência dramatúrgica. Entre a designada “atemporalidade” e o novo. Entre a tradição e o maneirismo, ou a iconoclastia. Entre o cânone e a tentativa de refletir, sobre ele, (mais) um olhar idiossincrático. Entre a história das sucessivas versões da peça e o propósito de quem tenta desafiar essa história, ou inscrever-se nela. Dialéticas.
Wilde é o resultado de uma colaboração entre a companhia de teatro mala voadora e o bailarino e coreógrafo Miguel Pereira, do Rumo do Fumo.
Baseia-se na peça Lady Windermere’s Fan: A Play About a Good Woman, de Oscar Wilde2 e, mais especificamente, no registo áudio da sua versão radiofónica produzida pela BBC Radio 7. O espetáculo é uma apropriação desse registo de uma performance do passado, ela própria uma apropriação de uma peça do seu passado. É um espetáculo historicista, ou arquivista. E não é.
1. Lady Windermere’s Fan, A Play About a Good Woman, de Oscar Wilde, estreou a 22 de Fevereiro de 1882, no St. James Theatre, em Londres. Em 1883, a peça foi publicada, na língua inglesa em que foi escrita. Em 1916 e em 1925, foram feitas adaptações para o cinema mudo, dirigidas respetivamente por Fred Paul e por Ernst Lubitsch. Em 1949, Otto Preminger realizou um novo filme, intitulando-o sumariamente The Fan. Em 1944, a peça foi apresentada pela primeira vez em Portugal, no Teatro Nacional Dona Maria II, pela companhia Amélia Rey Colaço e Robles Monteiro. Foi traduzida pelo Dr. Júlio Dantas e adquiriu o título O Leque de Lady Windermere. Em 1993, com o mesmo título mas com nova tradução de Maria João da Rocha Afonso, voltou a ser apresentada no Teatro Nacional, com encenação de Carlos Avilez e coreografia de Luís Moreira. Foi também transformada em musical, filmada para a televisão e interpretada em versões radiofónicas.
2. Lady Windermere’s Fan é uma crítica às convenções da sociedade vitoriana. Satiriza o moralismo das “reputações” e a redução da “virtude” a uma questão de aparência. Em contraste com o modelo dramático no qual o desenlace justo e feliz resulta da “reposição da verdade” pelo herói, Wilde constrói um enredo em que a felicidade das personagens é garantida pela ardilosa construção de uma mentira por uma mulher cuja reputação é duvidosa.
Wilde is based on the world of Oscar Wilde. And his play Lady Windermere’s Fan.
Wilde is a co-creation of the mala voadora theatre group and choreographer Miguel Pereira.
Wilde perhaps begins as theatre and ends as dance. Or perhaps it begins as dance and ends as theatre. Or both. Or neither.
Wilde is a show with a text and without a text – apolitical, conventional, elegant, radical and political. And wild.
Wilde has a message, it is entertaining, boring, disappointing, exciting, and doesn’t mean anything at all.
Or perhaps it does.