A ideia de fazer música com as minhas esculturas surgiu com a oportunidade inesperada de tocar com o ritmo constante do motor de um frigorífico, que variava no passo como se fosse um músico e não um eletrodoméstico.
A experiencia marcou-me: no meu percurso como escultor as peças adquiriram sons. As máquinas têm sons que nos sugerem lugares, momentos e ações que podemos visualizar ao ouvi-las.
Nesta viagem, o caminho é guiado por uma extrema atenção ao momento. Contrapor, acompanhar, desligar, negar e quebrar são escolhas que estão intrinsecamente ligadas ao som.
A música permite-nos vogar no tempo por lugares surreais, originando uma sequência de imagens aleatórias que nos conduzem num discurso permanente, alternado de silêncios e espaços com diferentes intensidades.
As esculturas desta instalação fazem parte de um todo, integradas em termos físicos, visuais e sonoros. Fica assim criado o espaço para cada um dos participantes percorrer.
João Parrinha
João Parrinha é músico (percussionista) e artista plástico com atividade nos domínios da escultura, da pintura, do cinema e do vídeo, tendo igualmente desenvolvido trabalho como cenógrafo. Integrou a formação de blues IBM e com o seu irmão José Bruno Parrinha fez parte na década de 1980 da banda pop Radar Kadafi. Fundou com Sei Miguel e Fala Mariam o trio Moeda Noise, virando-se para a música improvisada. Desde então, tem colaborado com músicos desta área como Paulo Curado, Rodrigo Amado, Carlos “Zíngaro”, Ernesto Rodrigues, Joana Sá e João Lucas, entre outros. As suas criações visuais tiveram sempre um caráter especial: pintou pranchas de surf, concebeu os cenários de concertos de Oasis, Madredeus, Rui Veloso, Ornatos Violeta, Zen e Moonspell e está atualmente a trabalhar num projeto ecológico de transformação de “lixo” em arte, designado por Skeletonsea.
Sobre o ciclo “Vinte e sete sentidos”
Logo no início do século XX, Kurt Schwitters e poucos outros como ele propuseram-se contemplar os «vinte e sete sentidos da sensorialidade». Quase 100 anos passados, é com a amplitude da perceção humana que as artes de ponta preferem lidar, juntando o tempo e o espaço, o ouvido e o olho. O ciclo “Vinte e sete sentidos” equaciona a performance com a instalação, relacionando a música com outras expressões artísticas, em projetos transdisciplinares e de interação dos meios utilizados. Os conceitos e as práticas variam consoante as perspetivas dos artistas convidados e pretendem-se sempre imprevisíveis. Se a tecnologia hoje ao dispor permite, já por si, o atravessamento das linguagens possíveis, o foco está na criação de soluções menos óbvias, sempre procurando ir para além das finalidades originais de cada funcionalidade.