Better thou / Hadst not been born than not to have pleased me better.
Rei Lear à sua filha
Daddy's working boots have filled their obligation.
Dolly Parton sobre os sapatos do pai
Na primeira cena do Rei Lear de Shakespeare, o velho tenta entregar o reino num gesto grandioso às suas três filhas na esperança de assim garantir uma solução para a sua velhice – um plano que falha violentamente. Isto não surpreende, já que, de todas as permutas em que nos envolvemos, a que se faz entre as gerações é a mais complicada e tortuosa.
Os estábulos que é preciso limpar estão cheios até cima com datas e pormenores, bugigangas, genealogias, leis de descendência e herança, doenças hereditárias, juramentos de amor, assistência ao domicílio, faturas do gás e sentimentos de culpa – tudo é moeda de troca neste confronto público de filhas e pais. Para Testament, as She She Pop convidaram os seus pais a juntarem-se-lhes em cena. O teatro é a mesa das negociações para um processo utópico: um compromisso entre as gerações.
Escolhido como um dos melhores espetáculos alemães de 2010, no Theatertreffen de Berlim, Testament tem cativado os teatros europeus e mundiais por onde passa.
She She Pop é um coletivo de Berlim fundado em finais dos anos 90. Não têm encenador ou autor: a responsabilidade artística é dos performers, que encontram tarefas interessantes para cumprir e resolver em palco, no que é por vezes interpretado como teatro autobiográfico. She She Pop é um coletivo experimental (porque explora os princípios básicos da comunicação teatral) e feminino (independentemente da existência de membros e colaboradores masculinos).
Desde o início que se aprecia a profundidade lúdica de pensamento que She She Pop colocou nesta peça formalmente aventurosa e maliciosamente comovente de "reality theatre". Parte análise de texto, parte autoanálise, o espetáculo da companhia alemã explora arquétipos shakespearianos como modelos duradouros da psicologia contemporânea. (...) O prazer inebriante de Testament é que é possível divertir-se imenso e ser esperto ao mesmo tempo.
Peter Crawley, The Irish Times, outubro 2011