Não é exagero considerar a guitarra de Luís Lopes como das mais idiossincráticas vozes das franjas mais experimentais e exploratórias do jazz – quer no contexto de grupos como o Humanization 4tet, ao lado de figuras como Rodrigo Amado e os irmãos Aaron e Stefan González, ou o Lisbon Berlin Trio com Robert Landfermann e Christian Lillinger, quer, e sobretudo, nos seus dilacerantes noise solos, o músico lisboeta tem vindo a dar mostras de um estilo único, onde o caos e a explosão são paradoxalmente enquadrados por um controlo e uma direção irrepreensíveis e um foco absoluto na gestão do silêncio. É talvez a partir desta última característica que surge Love Song – disco lançado em 2016 e que pode, porventura, ter surpreendido os mais desatentos – autêntico enigma feérico, invulgar na sua nudez e dimensão autorreflexiva, e magistral passo em frente no percurso do guitarrista.
Na grande maioria dos casos conhecidos, e em particular no universo da pop, o passar dos anos sacia a sede de experimentação e a obra erigida cria uma confortável rede de segurança. Para Ana Deus, cantora sedeada no Porto a quem devemos um papel substancial nos Ban e, em particular, nos saudosos Três Tristes Tigres, a curiosidade genuína e a necessidade de arriscar parecem agudizar-se a cada novo projeto. Já tinha sido esse o caso dos Osso Vaidoso, que dava continuidade à frutuosa parceria com o guitarrista Alexandre Soares, e parece sê-lo ainda mais com este novo projeto Bruta, em que, acompanhada pelo multi-instrumentalista Nicolas Tricot se atira sem rede ao desafio de musicar a poesia de autores atormentados, loucos, deprimidos, perturbadores – como Ângelo de Lima, Mário de Sá-Carneiro ou Sylvia Plath.