Valeriano Paños passou, entre outras, pela Compañia Andaluza de Danza e pelo Ballet Nacional de España. Antonio Ruz tem um currículo impressionante porque trabalhou e trabalha com as melhores companhias de ballet, de dança contemporânea ou de flamenco, para além de também ser coreógrafo. David Coria dançou com reputadas companhias de dança, trabalhando atualmente com o Ballet Flamenco de Andalucía. Estes três andaluzes, todos premiados e habituados a trabalhar em conjunto, interpretam Danza 220V, criado por Rafael Estévez e os dois primeiros bailaores referidos, em colaboração com a música eletrónica de Artomatico e a voz castiça de uma cantaora de primeiro plano, Sandra Carrasco. Misturam tradicional com contemporâneo, carne como máquina, barroco com neoclássico, onde por vezes surgem lampejos do mais antigo folclore espanhol.
O palco está vazio e escuro. E é sempre da escuridão que bailaores e cantaora vão surgindo para uma luz que ilumina sobretudo os braços, as mãos, a cara, que sobressaem dos fatos escuros. A eletrónica suave dos aparelhos de Artomatico, em conjunto com o cante de Sandra Carrasco, fazem a música. A cantaora evolui em torno da velha crueza da poesia popular, enviando uma mensagem que marca o mais primitivo e emotivo tom da comunicação entre os homens.
Chame-se-lhe flamenco contemporâneo, com grande influência da linguagem da dança contemporânea, ou chame-se mesmo dança contemporânea em torno do flamenco, trata-se de uma criação muito bela que se insere nos novos caminhos que o flamenco já há alguns anos anda a explorar.
Flamenco contemporâneo, sim, mas também flamenco tradicional, improvisado no baile e no canto, com a força que em parte os liga à terra e em parte os ergue aos céus, e a nós com eles.